Publicado em:
21/12/2023
Amado por alguns e odiado por outros, o jejum intermitente é uma estratégia alimentar que ainda apresenta poucos benefícios cientificamente comprovados
O jejum intermitente é um padrão alimentar que envolve alternar entre períodos de jejum e alimentação. Diferente de dietas convencionais que focam principalmente nos tipos de alimentos consumidos, o jejum intermitente concentra-se principalmente no momento em que você come. Isso significa que você não está limitado a certos tipos de alimentos, mas sim a quando você os ingere.
Na literatura médica, os dois tipos mais comuns de jejum incluem a :
Além desses tipos de jejuns mais estudados, há também os jejuns de cunho religioso, como o jejum do Ramadã que é uma prática observada por muçulmanos em todo o mundo durante o nono mês do calendário islâmico. Durante esse período, os muçulmanos jejuam do nascer ao pôr do sol, abstendo-se de comer, beber, fumar e envolver-se em relações sexuais.
Para o processo de emagrecimento, o conceito fundamental que deve ser obedecido é o do déficit calórico, ou seja, comer menos do que se gasta. Quando falamos de déficit calórico, estamos nos referindo à restrição de energia fornecida ao nosso organismo e essa restrição pode ser atingida a partir da seleção de macronutrientes (“ o que você come”) ou através da redução da janela alimentar (“quando você come”).
Os estudos mostram que não há sentido em adotar a estratégia do jejum intermitente para perda de peso se não houver restrição calórica associada. Além disso, não há maior perda de peso se comparamos o jejum intermitente a qualquer outro tipo de planejamento alimentar que forneça a mesma quantidade de energia.
No entanto, para algumas pessoas, o jejum pode ser mais uma ferramenta que auxilia no processo de emagrecimento, uma vez que inserir períodos de tempo em que o paciente não está se alimentando, pode reduzir a quantidade de calorias que ele consome ao longo do dia. Além disso, algumas abordagens de jejum intermitente podem ajudar a diminuir a compulsão alimentar e a ingestão de lanches não saudáveis, contribuindo para melhor controle da ingestão calórica.
Existem algumas evidências de que a restrição calórica pode estar associada a benefícios para a longevidade em estudos com animais e, em menor medida, em estudos observacionais em humanos. No entanto, é importante notar que a relação entre o jejum intermitente e a longevidade ainda não foi estabelecida e continua sendo um campo de pesquisa em andamento.
Alguns estudos que avaliaram a resposta de seres humanos ao jejum identificaram benefícios como a melhora da sensibilidade à insulina, redução da glicemia, redução da pressão arterial, melhora do perfil lipídico e redução dos marcadores de inflamação e estresse oxidativo.
No entanto, a maioria desses trabalhos não conseguem diferenciar se esses benefícios estão diretamente relacionados ao jejum ou às consequências dele, notadamente a perda de peso. Dessa forma, não há evidências significativas que atestem que o jejum intermitente traz vantagens metabólicas adicionais em relação às demais estratégias alimentares para o emagrecimento.
O estudo “Calorie Restriction with or without Time-Restricted Eating in Weight Loss”, publicado pelo NEJM em 2022, acompanhou 139 indivíduos em restrição calórica por 12 meses, parte deles obedecendo uma janela alimentar específica e parte deles sem janela alimentar determinada. Os resultados foram semelhantes com relação à perda de peso e outros marcadores metabólicos.
Embora a evidência científica ainda seja escassa, especula-se que priorizar a alimentação no começo do dia tenha benefícios superiores. Isso porque no período noturno há o pico de produção de grelina, um hormônio que aumenta a fome. Caso o indivíduo se alimente nesse horário, a chance de que ele ingira mais calorias é maior, favorecendo o ganho de peso. Dessa forma, fazer o café da manhã e jantar mais cedo são hábitos que aparentemente estão relacionados ao menor ganho de peso.
Reduzir a janela alimentar também pode diminuir o padrão beliscador em alguns casos, sendo que estudos observacionais mostram que pessoas que beliscam mais ao longo do dia tendem a ganhar mais peso.
Sempre que a restrição calórica for muito acentuada, prolongada e desbalanceada, com ou sem jejum, há o risco de que, além da perda de gordura, ocorra justamente a redução da quantidade de massa muscular. Essa redução da massa muscular é maléfica pois ocasiona redução da taxa metabólica basal e favorece o acelerado reganho de peso.
O que se sabe é que, no processo de emagrecimento, é possível garantir o aporte de proteína diário adequado observando-se algumas janelas de restrição alimentar, que devem ser avaliadas caso a caso.
A associação com atividade física resistida (musculação) e suplementação adequada são fundamentais para que a jornada de perda de peso seja saudável e sustentável.
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